FREUD ERA UM MENINO DA MAMÃ (DIGAMOS ASSIM)

07-10-2023

Sigmund Freud era um homem forte, autoritário, empreendedor e corajoso, características que é costume associar-se a tudo menos àquela ideia feita segundo a qual os chamados meninos da mamã são frágeis, submissos e mimados.
Neste sentido, frágil ele não era, submisso muito menos, mas, de um outro ponto de vista, correspondia àquilo a que poderemos designar um menino mimado. Se conhecermos alguns aspetos da história da sua vida, particularmente do tempo da infância, conseguiremos compreender melhor a razão da minha afirmação.
O pequeno Sigmund foi o primeiro dos oito filhos que Jakob Freud e Amalia Nathansohn tiveram.Sigismund (assim era o seu nome original, que mudou para Sigmund apenas aos 16 anos), nasceu no dia 6 de maio de 1856 na cidade de Freiburg, que na altura pertencia ao Império Austríaco (futuro Império Austro-Húngaro) e atualmente é designada Příbor e faz parte da Chéquia. Quando nasceu, o pai tinha 40 anos (e dois casamentos anteriores) e a mãe tinha apenas 20.
Jakob era comerciante de lãs, mas o negócio ficou tão afetado que a solução que arranjaram foi mudarem-se para Leipzig. Não permaneceram nessa cidade mais de um ano e acabaram por mudar-se definitivamente para Viena quando Sigmund tinha quatro anos.
Ele foi sempre o mais bem tratado e privilegiado dos filhos, sobretudo por parte da mãe. E quando cursava o ensino secundário, para dar apenas um exemplo, ele era o único dos filhos que tinha um quarto só para si. Mas esse não era o único privilégio de que desfrutava: quando estava a estudar (o que acontecia na maior parte do dia), as irmãs estavam proibidas de fazer barulho para não o incomodar.
Jakob tem sido descrito como um homem simples, tranquilo e generoso. E pouco autoritário, ao contrário do filho. E, apesar (ou, mais provavelmente, por causa) do precário sucesso que teve nos negócios, investiu tudo no do filho (para o tornar "alguém" na vida), e nunca disfarçou o enorme orgulho que sempre nutriu por ele.
Amália, de acordo com as memórias do neto Martin, o filho mais velho de Sigmund Freud, "falava bem e não tinha papas na língua; uma mulher de caráter resoluto, pouco paciente e extremamente inteligente". Ernest Jones, o biógrafo "oficial" de Freud (cuja biografia, embora muito completa, foi demasiado parcial e idealizada) disse que ela era "animada e bem-humorada", mas os netos tinham outra opinião. Para eles, a avó, embora inteligente e com uma notável força de vontade, era temperamental e, por vezes, egoista.
Dizem que ela era egocêntrica e tirânica com as filhas, mas adorava Sigmund, a quem chamava "meu Sigi de ouro".
Freud confirma:
"Fui o preferido de minha mãe durante toda a vida."
Tudo isto contribuiu certamente para a ideia que Freud construiu sobre a relação entre uma mãe e o seu filho:
"A única relação que dá satisfação ilimitada a uma mãe é o que ela estabelece com o filho; é, de fato, o mais perfeito e menos ambivalente de todos os relacionamentos humanos ".
E mais:
"Um homem que foi o favorito da sua mãe mantém para toda a vida a sensação de conquistador e a confiança no sucesso, a qual leva, muitas vezes, ao sucesso real."

Foi um amor eterno enquanto ambos estavam vivos, mas um dia ambos haveriam de sucumbir ao destino que a todos nos espera.
Há pessoas que dizem que querem morrer primeiro do que aquela que mais amam. Porquê? Para não sofrerem com a sua perda. Mas essa não será uma atitude egoista? E a outra pessoa, caso esta morra primeiro, como fica?
Numa carta que escreveu ao psicanalista Karl Abraham, quando a mãe já tinha 83 anos, Freud disse-lhe que preferia que ela morresse primeiro pois isso dar-lhe-ia "um pouco mais de liberdade", já que não queria admitir a ideia de que fosse necessário alguém dar à mãe a notícia da morte do seu amado filho.
Amalia morreu aos 95 anos, quando Freud tinha 75 e já estava muito doente. E nessa altura, aliviado, escreveu a um amigo psicanalista: "Eu não tinha liberdade para morrer enquanto ela estivesse viva, mas agora tenho". Não compareceu ao funeral e declarou ao amigo e discípulo Sandor Ferenczi: "Nada de dor, nada de luto".
E, ao fim de nove anos, acabou por falecer.